Primeira Página

O JEITO BRASILEIRO DE SER

J. Ciro Saraiva, tão cedo partinte, foi um dos escolhidos por Lustosa da Costa para o livro que teve como protagonista este repórter, e aí vão pinceladas do que escorreitamente escreveu:

Nas redações por onde passei – rádios, jornais e televisões – sempre ouvi muitos questionamentos sobre Lúcio Brasileiro. Ainda hoje, despertam curiosidade seu modo de ser, o tipo de jornalismo que pratica e uma certa “cartolagem” que deriva de suas ligações pessoais com os patrões. Creio que isso sempre foi de seu conhecimento, mas nunca o vi preocupado ou abespinhado com tais comentários. Aliás, nunca o vi preocupado com coisa alguma, nem mesmo quando o chamaram de vampiro. De certo modo, até sempre alimentou esse “ar” de perplexidade que se formou em torno dele, com sua criatividade, suas chalaças, seu gosto de ser diferente.

Conheço gente que considera Lúcio Brasileiro um chato, mas não deixa de ler sua coluna, um dia sequer. E, na televisão, batizou sua intervenção diária de Primeira Página, ensinando, em trinta segundos, que o consumo de berinjela controla a hipertensão e que é o vinho branco e não o tinto que deve acompanhar o peixe.

Trabalhamos juntos duas vezes. Nos “associados”, inicialmente, e no final dos anos 70, na antiga TV Uirapuru, depois Cidade. Sempre bem-humorado e irradiando fraternidade, levou-nos – a mim, Narcélio, Assis Tavares, Fernando Maia e outros – à sua casa cumbucana, La Belle Aurore.

Algumas coisas que ouvi de Lúcio incorporei aos meus conhecimentos. De todas as observações, ressalto sua imagem sobre amizade: “Amigo verdadeiro é aquele cara que está no ponto do ônibus e o outro passa de carro, sem lhe dar uma carona. Em vez de ficar resmungando contra o companheiro, ele prefere cogitar sobre o que está ocorrendo: Fulano deve estar com algum problema, para não ter parado. Quando chegar à redação, vou ligar para ele.”

Em outras palavras: amigo não cobra, compreende, é generoso. E não importa se passam muito tempo sem se encontrarem. Quando isso ocorrer, serão sempre os mesmos. A última vez que estivemos juntos foi em 1996, quando me entrevistou no seu programa da TV Jangadeiro.

Participei de algumas “reinações” de Lúcio Brasileiro. A que me recordo, mais fortemente agora, é uma viagem de trem que ele inventou, em 1985. A ideia motora era levar Hermenegildo de Sá Cavalcante a rever a cidade onde nasceu, após 40 anos de ausência. Partimos de Fortaleza, um grupo de jornalistas, às 21h, e após uma noite toda de libações, a que não faltou naturalmente uísque, amanhecemos na terra natal que era também do Brasileiro, onde uma banda de música nos recebeu.

Quando me fez contar as histórias do Bonaparte Maia, que fora seu patrão em O Jornal, e ao discursar em campanha para deputado, em Quixeramobim, proclamou no palanque: Não tenho apenas mil contos, como dizem, tenho muito mais, e a esta hora poderia, em vez dos sertões do Ceará, estar nas praias de Espanha, ouvindo músicas selecionadas por mim ou por meus assessores.

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