Primeira Página

BRASILEIRO POR WANDA PALHANO

Acabara de reler a última página da obra-prima de Oscar Wilde, “O Retrato de Dorian Gray”.
Mais uma vez ficara deslumbrada… e foi neste momento que senti um desejo de me desligar um pouco da rotina diária e aprofundar-me na razão de ser daquela personagem que sempre me havia transportado para um mundo bem diferente, cheio de surpresas, livre, onde as coisas belas, por si só, conseguiam tirar da escuridão certas almas profundamente descoloridas, amarguradas pelo simples fato de não entenderem, não saberem distinguir, separar o feio, o bom do mau, nem mesmo encontrarem as linhas da suprema virtude, da majestosa força do “belo-horrível” que tem o poder de encantar as almas, sui-generis, ricas de poesia, de sentimentos fortes e nobres.
Estas pessoas não possuem a capacidade de separar o feio e o belo, sem destruir a arte pura e verdadeira.
Foi neste momento transcendental de meu ser irrequieto, que segui o impulso de sair, ver o mar, que sempre teve a força de acalmar meu espírito, reformular meus pensamentos mais melancólicos, quando a saudade conseguia dominar-me.
Passei em frente à casa de Paul Mattei… ouvi uma música que contaminava a noite e nos fazia sonhar de olhos abertos. Algo me atraía, dominava-me.
Não pensei duas vezes. Subi a pequena escada e obedeci ao convite da melodia.
Adentrei a casa do jovem francês que detinha a simpatia de nossa sociedade e que, por sinal, casara com uma das mais belas mulheres de nossa Fortaleza, Sandra Gentil.
O ambiente estava repleto de gente que amava a vida e neste momento inesquecível bailava ao som de todos os ritmos. Não havia ali lugar para o silêncio, nem para a tristeza.
Olhei para todos os lados e lá numa poltrona avistava um personagem sozinho, bem atento aos acontecimentos.
Já o conhecia de nome, mas nunca o havia encontrado. Ao me ver aproximou-se e, sem uma palavra, abraçou-me forte e saímos acompanhando o ritmo da música.
Festejamos nosso reencontro, a aproximação de almas gêmeas que, naturalmente, já se conheciam em outras épocas, em outras vidas…
A surpresa não me paralisou. Deu mais vida a nossa vida, estava frente a frente ao personagem do livro que acabara de ler. Ele era o meu Dorian Gray, o qual me atraíra àquele encontro. O nosso colunista social, jornalista Lúcio Brasileiro.
A partir deste encontro, fortificamos nossa amizade, nosso bem-querer, terno, recíproco, verdadeiro, sem cobranças.
Lúcio personificava aquele que vibra com o belo, com a beleza física e interior, acima de qualquer qualidade. Ser belo é ser inteiro, é amar, agradar, ser gentil, generoso, alegre e semear alegria nos momentos oportunos. A beleza é um dom divino imensurável que não se atém apenas ao corpo físico, mas à alma, e se transporta para a maneira de ser, agir e viver! É por esta razão que Lúcio Brasileiro ama as pessoas belas, ou melhor, ele ama a beleza em todo o seu esplendor!
Lúcio tem uma personalidade muito forte que não se abala com nenhum terremoto.
Sua vida é sua vida, segue a trilha que ele mesmo traçou e nada o faz diferente.
Em um dos seus aniversários, quis presenteá-lo com algo real que o marcasse em cores bem vivas.
Chamei a pintora de nome Lurdinha, que já fizera grandes obras de arte, que já pintara o retrato de várias personalidades, e pedi que ela retratasse o meu amigo Lúcio Brasileiro, o meu Dorian Gray, em todas as cores, com todas as tintas, ressaltando o amarelo, sua cor preferida.
Em sua penúltima festa de aniversário, lá estava, na entrada do Centro de Convenções, o seu quadro, com todas as cores de sua forte personalidade. Ao me aproximar, o retrato me sorriu. Foi sua única manifestação. O resto foi silêncio.
(Do livro Um Brasileiro Muito Especial, do Lustosa da Costa)

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